sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Um ano é muito tempo...

Há 8 anos nesta época eu andava tão feliz que não cabia em mim... A gravidez estava a correr lindamente... A vida estava a ser tão generosa comigo que eu não queria acreditar... Ainda não tinha percebido que a vida sempre fora generosa comigo... As pessoas é que não... Eram tempos mágicos e doces... Por esta altura ele já mexia tanto... Foi um tempo que passou e que não volta mais... Mas com isso aprendemos a viver... As coisas acontecem e passam... ficam as doces recordações... Mas como recordar o que não aconteceu?

Está a fazer um ano esta noite que foi a última noite que ele passou em casa... Por volta das 16 horas do dia 26 de Fevereiro de 2010, enquanto se encontrava calmamente a fazer os trabalhinhos de casa com o pai, foram buscá-lo como um porco que vai para matança e levaram-no no meio de gritos de horror que suplicavam que não lhe tirassem os paizinhos...

Se nesse dia me tivessem dito que um ano depois eu ainda não tinha recuperado o meu filho, não restavam esperanças de o recuperar e , no entanto, eu continuava viva, eu teria dito que era impossível. Todas essas coisas juntas não eram possíveis na minha cabeça. Eu achava que ou recuperaria o meu filho rapidamente ou iria sucumbir à dor, ao desgosto... Um ano depois, interrogo-me se realmente estou ainda viva ou se sou apenas uma morta-viva... A viver os últimos dias, como disse ontem no ouro blog... Sinto que muito tempo mais não vou aguentar... Ninguém aguenta sozinha contra o mundo... Pode haver quem aguente... De vez em quando ouve-se falar em grandes lutadores, que venceram todas as batalhas, ou que perderam batalhas, mas acabaram por vencer a guerra... O curioso é que esses grandes lutadores falam sempre de pessoas que os ajudaram a lutar... Lutaram muito... Mas a certa altura, lá terá aparecido alguém...

Os primeiros meses foram de muita dor, mas também de muita luta e esperança. Mudamos de casa. Arranjamos relatórios médicos... Relatórios da Escola... Mas nunca mais quiseram saber de nós... Isso de retirarem crianças aos pais com o intuito de "fazerem um trabalho com os pais" a fim de que elas regressem para os braços das familias que adoram e que as adoram é treta. Não é nada assim... Tentamos contactar a assistente social sem sucesso... E lá o íamos vendo uma vez por semana e telefonando para ele duas vezes... E lá ia ele crescendo longe de nós...

Seguiram-se uns meses em que andei num curso para onde me mandaram dizendo que era positivo para o processo e que só serviram para me manter suficientemente ocupada para não pensar demasiado na minha dor...

Foram adiando a estadia dele na instituição, sem nunca falarem connosco, nme avaliarem as nossas "condições"... E ele a crescer...

Finalmente, na audiência de 8 de Novembro tiraram-nos quase tudo do pouco que restava e acabaram com as nossas esperanças: os telefonemas terminaram e a partir do momento em que fosse entregue à avó paterna, dia 17 de Dezembro, só o poderíamos ver durante uma hora quinzenalmente, a 83 Km de casa, durante 2 meses... Depois já poderíamos passar a ter visitas semanais em casa da avó e telefonemas... A questão é que esses dois meses já passaram e nada de mudarem a periodicidade e o local das visitas, nem nos deixarem falar com ele ao telefone... Nem nisso falam sequer... Por mais que perguntemos, só nos respondem que não sabem de nada...

E assim passou um ano... Um ano em que ele cresceu longe de nós e o vimos tão pouco... como recordar este ano da vida dele??? como recordar o que nunca aconteceu??

Pergunto-me às vezes se pensam que nos estão a prejudicar só a nós ou se estão conscientes de que o principal prejudicado é ele. Sim, nós também... Mas nós somos adultos e já sabemos que a vida é injusta... Ele era inocente...

Não dá para aguentar por muito mais tempo... As forças estão cada vez mais gastas... E eu estou cada vez mais sozinha... Passou um ano... Um ano é muito na vida de uma criança de 6/7 anos... Um ano é muito e ao mesmo tempo muito pouco para uma criança desta idade conhecer 3 escolas e 3 realidades diferentes...

Passou um ano... Um ano em que um pai perdeu um emprego por preconceito, pois um pai a quem tiram um filho, "não é, de certeza um empregado desejável numa empresa"... Um ano em que um casal viu o seu projecto de vida e família cair por terra e o seu casamento abalado... Um ano em que uma criança lidou com a tristeza de ouvir os colegas da escola gozarem com ele por "não ter pais"... um ano em que uma criança foi obrigado a ter que ouvir a avó paterna falar mal da sua mãezinha... Um ano em que, no final, uma criança é obrigada a viver aos empurrões entre a casa do avô e da avó... duas realidades tão diferentes...

Quando eu era pequena lembro-me de uma canção, a que hoje se atribuiria o género pimba que dizia "Cada mulher que eu já amei é uma sombra, que nme sequer poderá ser a sombra dela"... Piroso, naquele sentido, mas é assim que eu me sinto, quando me vejo ao espelho e me lembro da mulher que era há um ano atrás: uma sombra, que nem sequer poderá ser a sombra da mulher que fui... Essa mulher desapareceu... Em breve também esta sombra irá desaparecer... Tudo tem um limite e tudo tem um fim... Não há mais forças para manter esta sombra... Ela nem sequer tem nada a ver com a mulher que lhe deu origem...